Wednesday, October 01, 2008

A praia de Bournemouth...

No meio de julho decidimos aproveitar alguns dias do verão para pegar uma praia. Pare! Releia esta primeira frase. Mais uma vez. Você consegue identificar as inconsistência? Vamos fazer uma breve análise. Primeiro ponto: verão em julho. Desde quando verão aqui em Londres acontece em julho!? Claro, oficialmente, julho é verão. Mas isso nunca acontece. De fato, o verão só chega, quando chega, em meados de setembro, quando as férias se acabaram e os alunos já estão todos de volta às aulas. Segundo ponto: “aproveitar alguns dias no verão”. Já sabemos como é o verão por aqui (veja post anterior para melhor descrição). Então também sabemos que não é possível aproveitar alguns dias do verão. Simplesmente porque o verão não tem mais que um dia aproveitável. Verão, aqui, é veraneio. Talvez para melhorar um pouco a sentença, poderíamos substituir “alguns dias do verão” por “um dia de verão”. Terceiro ponto: “pegar uma praia”. Bom, aí já é querer demais. No único dia de verão do ano alguém ainda tem a esperança de estar na praia!? É forçar demais as barreiras da probabilidade. Certamente nunca acontece para quem planeja suas viagens. A única forma de você estar na praia neste dia de verão é se tiver alguma reunião de negócios no litoral. Daí, além de ficar o dia todo dentro de uma sala sem ar condicionado, vai conseguir, no máximo, caminhar de terno pela orla carregando o sapato no ombro. Ao fim de nossa rápida exegese, podemos reescrever a frase com mais realismo: “Em um dia do ano passado, conseguimos passar algumas horas sem chuva no litoral rochoso da Inglaterra” (nem sonhe com praia de areia fina e água de coco).

Mas vamos deixar esta longa e prosaica introdução pra lá. Pois não foi nada disso que aconteceu. Em julho de 2007 fomos mesmo passar alguns dias muito agradáveis em Bournemouth. Trata-se da melhor praia da Grã Bretanha (na opinião dos ingleses, é claro) e fica há pouco mais de uma hora ao sul de Londres. Pegamos o trem de manhã (não tão cedo) e chegamos por lá na hora do almoço. Ficamos hospedados numa guest house, um tipo de pensão, muito bem cuidada e decorada. Nós optamos por tomar um full English breakfast, preparado e servido pela dona da casa. Coisa de primeira! Não tinha lugar na mesa para colocar mais nada. O café serviu como almoço, de modo que não precisamos comer mais nada até a hora do chá da tarde. Bom, quase nada, como você vai descobrir mais pra frente no post. (Se quiser saber o que nos foi servido no café da manha, sugiro que leia um dos primeiros posts deste blog explicando o Englsih breakfast com ilustrações.)

Claro que quisemos ir para a praia logo no primeiro dia. Então deixamos as malas no quarto e saímos andando de bermudas, regata e chinelos para a beira-mar mais próxima. E a praia não decepcionou. Bournemouth é uma das poucas praias de areia na ilha. Quase todas as outras praias são formadas por um amontoado de pedrinhas roladas (aguardem um futuro post para conhecer Aberystwyth e Brighton). Mas em Bournemouth a faixa de areia é larga e plana. Há espaço para todos: crianças brincando, velhos dormindo e cachorros correndo. Também há muito espaço para o vento. E como venta! Apesar das bermudas, fomos espertos o suficiente para carregar um agasalho. E foi nossa melhor companhia.

Decidimos caminhar um pouco para sentir a areia nos pés – já que a água estava muito fria para colocarmos os pés dentro dela – e fomos andando sem rumo na beira do mar. O tempo foi passando e a fome foi chegando. De repente, lá estávamos nós, no meio do nada com os estômagos roncando mais que os rolamentos do meu fiestinha (poucos vão entender essa, mas o Leo e o pai Jéder vão). Decidi procurar no mar para ver se encontrava algum peixe dando sopa, mas a água estava tão fria que nem os coitados haviam saído de casa para oferecer sopa neste dia (mais uma para o Leo). De uma lado, montanhas, do outro, mar. E nada in between. A fome era tanta que comecei a provar algumas pedrinhas que estavam na areia. E foi a salvação. Fiquei com a barriga cheia, tranqüila, bem alimentado de sais minerais.

Foi então que comecei a desconfiar da Lilian. Eu estava pesado por conta de minha refeição. Contudo, a Lilian continuava levinha, mas sem fome. De uma hora pra outra ela parou de reclamar da fome. Foi quando eu descobri seu segredo: chocolate. Claro que eu fiquei bravo com ela. Isso não se faz! Trocar uma alimentação tão natural e rica por uma barra de chocolate ao leite! Deixei ela de castigo por duas horas sentada num banquinho numa ilha deserta. Ela aprendeu a lição, mas ficou sem voz de tanto gritar.

Nos outros dias voltamos muitas vezes para a praia. Bournemouth tem um pier muito bonito e um oceanário que vale a pena visitar. Mas, imperdível mesmo é o tradicional restaurante Harry Ramsden “The world’s most famous fish and chips”. Não é bem um restaurante, está mais para um boteco com muita, muita, mas muita fritura. Mas o peixe frito é mesmo uma delícia. E nada melhor que comer peixe frito na frente dos peixes vivos na beira da praia. Bournemouth também é uma cidade com muitos idosos. É a cidade ideal para a aposentadoria. Quente, limpa, relativamente plana, tranqüila e bem preparada para centenas de cadeiras de rodas motorizadas. No domingo fomos à igreja no culto da manhã. Sentamos mais ou menos no meio da igreja e, olhando ao redor, só vimos cabeças brancas (e algumas carecas). A média etária girava em torno de 75 e chegamos a desconfiar que estavam adicionando pedrinhas de naftalina no chá para mútua conservação.

Mas, para finalizar o post, tenho que contar sobre o reencontro. Em 1994, quando tinha 13 anos, fui para Bournemouth passar o mês de janeiro estudando inglês. Fiquei hospedado na casa da família Bayford: pai, mãe, filho, duas filhas, dois cachorros, dois gatos, dois ramsters e 5 estudantes estrangeiros, todos em harmonia sob o mesmo teto. Não preciso falar que a casa era muito cheia a animada. Adorei o tempo que passei com eles e sempre tive vontade de reencontrá-los. Pois desta vez fomos visitá-los. E, para minha surpresa, a família tinha aumentado ainda mais com a chegada de um neto. Não pudemos encontrar todos eles e ficamos lá por alguns minutes apenas, mas foi bom ter notícias dos Bayford novamente. Quem sabe voltaremos lá quando tiverem um bisneto?

Passamos ótimos dias em Bournemouth. O sol apareceu de vez em quando. Visitamos muitos lugares interessante e bonitos. Consegui realizar o sonho de visitar a ilha de Brownsea, local do primeiro acampamento escoteiro organizado por Baden Powell. Provamos comidas novas, diferentes, gordurosas e inorgânicas. Caminhamos muito. Tomamos vento. Tomamos chuva. Tomamos sol. E, finalmente, depois de 2 anos, pisamos novamente na areia da praia. E por falar em areia, tem uma coisa que não consegui entender: Quem teve a coragem de enterrar esse bebê!?





13/07/2007
Bournemouth and Poole
England



1 comment:

Anonymous said...

Desculpa invadir.
Interessante a descrição de seu dia na praia.
Tenho pouco a dizer.
1.Quem mora em Petrópolis, mesmo não tendo aqui praia, entende o que é um verão "invernoso, cavernoso se preferir"
2. Entretanto, os ares, o visual, os azuis , sempre dão uma renovada na alma-em qualquer litoral.
Boa sorte.